Samurais do Alvorecer
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descriptionCastelo Yagyu  EmptyCastelo Yagyu

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Castelo Yagyu  Nagoya-castle2


O castelo Yagyū é domínio de um clã, de mesmo nome, de grande prestígio, sendo situado em Nara e conhecida como uma das melhores escolas de esgrima do Japão.

descriptionCastelo Yagyu  EmptyRe: Castelo Yagyu

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15.1.1

“O homem terá perdido o juízo? Que pretende fazer com o pequeno servo, mantendo-o desse jeito, erguido sobre a cabeça?”, haviam-se perguntado todos, intrigados, tentando adivinhar-lhe a intenção.

Foi então que Musashi, do alto da sua estatura, arremessou o pequeno corpo de Joutaro contra o guarda. Os homens saltaram para trás com exclamações assustadas, abrindo uma pequena clareira. Atingir um homem jogando sobre ele um outro ser humano — a tática de Musashi, imprevisível e totalmente absurda — deixou-os sem ação.

Joutaro, ao ser lançado por Musashi, encolheu braços e pernas e desabou sobre o desprevenido guarda como um pequeno deus do trovão caído das nuvens em dia de tempestade, atingindo-o com um berro assustado na altura do peito.

O homem soltou um grito estranho e tombou para trás, rígido como um tronco de árvore, levando Joutaro na queda. Ao cair, bateu a nuca com força contra o solo ou fraturou o crânio no impacto com a cabeça do menino, dura como pedra: qualquer que fosse a hipótese, o guarda do cão soltou apenas um grito e se imobilizou. Um fio de sangue escorria do canto de sua boca. O corpo de Joutaro descreveu uma pirueta sobre o peito do homem e rolou mais alguns metros.

— Maldito!

— Rounin dos infernos!

As injúrias agora partiam de todos os vassalos da casa Yagyu ali reunidos, guardas ou não do animal morto. A reação violenta era compreensível, pois poucos sabiam que o rounin à frente se chamava Miyamoto Musashi e havia sido especialmente convidado pelos quatro veteranos.

— Muito bem — disse Musashi, recompondo-se. — Senhores.

Os homens haviam parado, à espera de suas palavras. Com uma expressão assustadora, Musashi abaixou-se e apanhou a espada de madeira que Joutaro deixara cair, empunhando-a em sua mão direita.

— O erro de um servo recai sobre seu amo: estou pronto a receber a punição, seja ela qual for. Porém, deixo claro um ponto: tanto eu como Joutaro temos a pretensão de viver pela espada, como dignos samurais. Não podemos permitir, portanto, que nos matem a pauladas, como a um cão. Aviso-os: o mínimo que faremos será opor-lhes resistência.

Suas palavras, longe de um reconhecimento de culpa, eram um desafio. Se àquela altura Musashi, em nome de Joutaro, se houvesse empenhado em sensibilizar os homens, desculpando-se e explicando a conduta do menino, talvez o incidente se tivesse resolvido a contento. A atitude, além disso, proporcionaria aos quatro veteranos, que hesitavam em intervir, a oportunidade de romper o silêncio e apaziguar os ânimos exaltados dos companheiros. Mas as palavras de Musashi manifestamente recusavam a oportunidade e agravavam o incidente.

— Insolente! — diziam os olhares penetrantes dos veteranos Shoda, Kimura e Debuchi, agrupados imóveis a um canto, contemplando com animosidade sua atitude.

descriptionCastelo Yagyu  EmptyRe: Castelo Yagyu

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15.1.2

Como seria de se esperar, a impertinência de Musashi enfureceu não só os quatro veteranos, mas todos os presentes. Os homens desconheciam a identidade de Musashi e não tinham meios para avaliar suas intenções. A insolência pôs lenha na fogueira de suas emoções exacerbadas.

— Quê...? Repete! — reagiu alguém.

— Atrevido!

— Deve ser um espião a mando de alguma província: amarrem-no!

— Não, é melhor matá-lo de uma vez!

Outra voz interferiu:

— Não o deixem fugir!

Pressionado por todos os lados, Musashi se viu em companhia de Joutaro — agora protegido sob um dos seus braços — prestes a desaparecer numa roda de lâminas nuas.

— Esperem!

A ordem partira de Shoda Kizaemon. No mesmo instante, Murata Yozou e Debuchi Magobei intervieram:

— Cuidado!

— Não toquem nesse homem! — intervieram os vassalos veteranos, falando pela primeira vez desde o início do incidente.

— Afastem-se! Vamos!

— Deixem este caso por nossa conta.

— Retirem-se todos, cada qual para o seu posto.

— Julgo que este homem tem algum plano oculto. Se cairmos em sua armadilha e disso resultarem vítimas, não teremos como nos justificar perante o grão-senhor. Sem dúvida, a morte do cão tem importância, mas uma vida humana é ainda mais importante. Garanto-lhes: nós quatro nos responsabilizaremos pelo incidente e os isentaremos de qualquer culpa. Retirem-se, pois, despreocupados.

Momentos depois restara no local apenas o pequeno grupo composto de quatro anfitriões e um convidado que haviam começado a noite juntos num aposento do Shin’indou. Agora, porém, o relacionamento anfitrião-convidado sofrerá drástica transformação, dando lugar à confrontação de um desordeiro com seus captores. Estavam em campos opostos.

— Musashi — se na verdade esse for o seu nome — para a sua infelicidade, desvendei o seu plano. Depreendo, pelo que vejo, que você se infiltrou em Koyagyu a mando de alguém, com o objetivo de nos espionar ou tumultuar o cotidiano do castelo.

Os olhos dos quatro homens pressionavam Musashi. Todos, sem exceção, eram magistrais espadachins. Musashi, ainda protegendo Joutaro com um dos braços, permanecia imóvel, parecendo ter criado raízes. Percebia que escapar, aproveitando um momento de distração desses quatro, seria quase impossível, ainda que tivesse asas.

— Ouve com atenção, Musashi — disse Debuchi Magobei, que desembainhara a espada alguns centímetros, em guarda. — O valor de um bushi se manifesta no momento em que, desmascarado, renuncia à própria vida. Embora você seja um tratante, reconheço-lhe a coragem, ao invadir destemidamente o castelo acompanhado apenas de uma criança. Conto ainda a seu favor as horas agradáveis que há pouco passamos e concedo-lhe a honra do seppuku: aguardaremos, enquanto se prepara para o ritual. Mostre-nos a firmeza de caráter de um verdadeiro bushi!

Os quatro vassalos imaginavam que assim solucionariam seus problemas. Uma vez que o haviam convidado sem o conhecimento do suserano, esperavam encerrar o incidente sem mais perguntas, enterrando para sempre as questões relativas à identidade e aos desígnios de Musashi.

Musashi, no entanto, estava longe de concordar:

— Como? Pretendem que eu, Musashi, cometa o seppuku? Absurdo! Não me façam rir! — gargalhou, sacudindo os ombros.

Era óbvio que Musashi provocava seus anfitriões porque queria descontrolá-los. Os quatro vassalos, que até então haviam conseguido manter-se impassíveis, franziram enfim o cenho:

— Então, é isso! — disse Debuchi. Embora serenas, suas palavras eram resolutas. — Mostro compaixão e recebo insolências em troca!

— Não percam tempo falando! — interrompeu Sukekuro, cercando Musashi pelas costas e empurrando-o. —Ande!

— Para onde?

— Para a cela!

Musashi assentiu e pôs-se em movimento. Contudo, suas pernas obedeceram apenas ao próprio comando e o levaram em largas passadas rumo ao pátio principal.

— Aonde vai? — gritou Sukekuro, colocando-se rapidamente no caminho de Musashi, abrindo os braços e interceptando sua marcha. — A cela não fica nessa direção. Dê meia-volta!

— Não dou!

Musashi voltou-se para Joutaro, que caminhava colado a ele, e sussurrou:

— Abrigue-se junto àqueles pinheiros!

A área em que se achavam parecia fazer parte de um jardim na entrada do pátio central. Robustos pinheiros de galhos bem-formados erguiam-se aqui e ali, e uma brilhante camada de areia, tão fina que se diria peneirada, forrava o chão. Obedecendo às instruções de seu mestre, Joutaro desprendeu-se do braço que o protegia e correu vivamente. Parou em seguida sob um pinheiro e nele se escudou:

“É agora! Ele vai entrar em ação!”

Em sua mente, ressurgiu a impressionante imagem de seu mestre nos campos de Hannya e, como um ouriço, sentiu os músculos do pequeno corpo se enrijecendo. Shoda Kizaemon e Debuchi Magobei tinham-se posicionado cada qual a um dos lados de Musashi, e o seguravam pelos braços. As mesmas palavras se repetiam:

— Volte atrás!

— Não volto!

— É a sua última palavra?

— É!

— Ora, seu... — finalmente perdendo o controle, Kimura Sukekuro, parado à frente de Musashi, soltou a espada da bainha com um estalido, momento em que os mais experientes Shoda e Debuchi intervieram, acalmando o companheiro e dirigindo-se a Musashi:

— Se não quer retroceder, aqui permaneceremos. Diga-me, porém: aonde ia?

— Ao encontro de Sekishuusai, o suserano deste castelo!

— Quê?

Ante a inesperada resposta, os quatro vassalos empalideceram, atônitos. A nenhum deles ocorrera que o objetivo secreto deste jovem fosse aproximar-se de Sekishuusai. Shoda perguntou:

— Que quer você com nosso amo?

— Sou um inexperiente estudante de artes marciais e desejo obter ensinamentos do fundador do estilo Yagyu, uma orientação que norteie minha carreira.

— Neste caso, por que não os solicitou do modo convencional, declarando-nos sua intenção?

— Porque soube que o grão-senhor recusa qualquer contato com estranhos, e não ministra ensinamentos a estudantes.

— Exatamente!

— Assim sendo, não vi outra alternativa senão desafiá-lo para um duelo. Mesmo que o desafiasse, porém, era certo que sua senhoria não sairia do refúgio que escolheu para passar os últimos anos de sua vida. Eis porque resolvi desafiá-los a todos, declarando guerra ao castelo.

— O quê? Declarou guerra ao castelo?

Os quatro vassalos o fitaram, boquiabertos. Em seguida, passaram a analisar seu rosto cuidadosamente, em busca de sinais de demência. Musashi observava agora o céu, abandonando os braços aos seus captores. Partindo da noite, um ruflar de asas chamara sua atenção. No instante seguinte os quatro vassalos também ergueram o olhar. Nesse exato momento, uma águia destacou-se da escura silhueta da montanha Kasagi e veio voando até pousar nas proximidades do celeiro do castelo, suas asas parecendo momentaneamente roçar as estrelas.

descriptionCastelo Yagyu  EmptyRe: Castelo Yagyu

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